Para quem estava acostumado com a qualidade dos festivais de música mais “arejados” do Rio Grande do Sul, o FUC, realizado pela UEPG, tem sido uma grata surpresa. É uma pena, mas os grandes festivais gaúchos, em especial aqueles que expandiram suas fronteiras rítmicas, musicais e geográficas, caso do Musicanto, da Moenda e do Canto da Lagoa, estão em franca decadência. As últimas edições não podem sequer ser comparadas em qualidade com aquelas dos anos 80 e início dos 90.
Mas desde que cheguei em Ponta Grossa, há dois anos atrás, o FUC tem me impressionado com a qualidade musical das concorrentes e com uma ótima organização – o que, sem dúvida alguma, faz (toda) a diferença.
Na última edição, encerrada sábado, dia 19, não foi diferente. A começar pelos ótimos jurados, super qualificados, inclusive na fase regional.
Das músicas que se classificaram para a final, nenhuma abaixo da crítica, e (quase) todas de excelente qualidade. A começar por aquelas oriundas da seleção regional. “Castelo” (5º lugar), de Phayga Gruber, mostrou que a simplicidade no arranjo e a singeleza na interpretação podem ser suficientes, desde que estejam em sintonia com uma boa letra e uma melodia cativante. A interpretação da autora, que evoluiu bastante da primeira até a última apresentação (foram três ao todo, duas nas eliminatórias e uma na finalíssima), também marcou a composição.
“Antiga Moda” (4º lugar), com belo trabalho vocal e refrão forte (“Uma moda de viola pra quem gosta de viola e não de moda”), de autoria de João Amalio Ribas, é um hino à música de raiz. Nas palavras do autor, “música não é produto, como fogão ou geladeira”. Um comentário bem instigante em noite de concorrência entre o FUC + João Bosco, no Ópera, e Victor e Léo, no Centro de Eventos...
O pernambucano Zé Manoel, que já havia se destacado no ano passado, recebeu o 1º lugar com “Acabou-se Assim”, uma canção interpretado por ele ao teclado e que lembra muito algumas composições de Chico Buarque.
O festivaleiro Zé Alexandre, ex-parceiro de Oswaldo Montenegro, ficou com o 2º lugar. "Água Boa de Beber" é canção típica de festival, com refrão forte e interpretação premiada pelos jurados. Aliás, os festivaleiros de costume, todos ótimos compositores e intérpretes, que rodam o Brasil inteiro nos eventos do gênero, não faltaram: Bilora, com a embolada “Peleja de Zé Coco do Riachão com o Capeta Famoso”; Carlos Gomes e Ivânia Catarina, com “Calanga Rei” (mais um refrão forte, vibrante – “Ô de dentro, ô de fora, louvemos a Nossa Senhora”); e Zebeto Corrêa (vencedor do FUC de 2008), com a singela “Corpo e Alma”.
Paulo Monarco, de Cuiabá, talvez tenha sido a melhor surpresa do festival. Sua “A Saber o Sabor”, 3ª colocada, era, sem dúvida alguma, uma das melhores músicas do festival. Excelente a letra, de Alisson Menezes, discutindo a noção de “verdade” no mundo contemporâneo:
“Você toma Coca-Cola sem saber o conteúdo,
E bebe as palavras como a ingerir morfina,
Faz da vida um imenso cálice
Sem notar que a verdade é apenas fé, menina!”
Os jurados acertaram dando à composição o prêmio de melhor Letra. Outro destaque foi o ótimo arranjo de Monarco, também o melhor desta edição, na minha opinião.
Entre as outras músicas classificadas para a final, destaque para “Pererê”, de Demetrius Lulo e Wagner Barbosa”, “Trem de Verão”, de Adilson Casado e Wilson Teixeira, “Cidade das Águas”, de Manoel Oliveira (que ficaria melhor com um arranjo mais arrojado); e “Mulato”, de Thirone. O ponto negativo do CD é “José Brasileiro”, que pretende fazer crítica social através de letra extremamente pobre e superficial, numa melodia também muito simples, imitando o estilo de Jorge Benjor.
Boas composições ficaram de fora da final
O CD do 23º FUC será de ótima qualidade musical. Pena que não haja grana para gravar em estúdio, o que valorizaria mais as músicas e a própria história/memória do festival. Infelizmente, gravações ao vivo muitas vezes pecam por problemas de sonorização, pelo improviso, pelos erros e mesmo pelos arranjos mal executados.
Aliás, esse foi o problema de várias boas músicas que não passaram à final. Caso de “Curitiba Vazia Sem Você”, uma bela milonga de Péricles Holleben Mello e Octávio Camargo Neto, que penou por ser muito mal executada na eliminatória do FUC regional. Nem tão grave foi o caso de “Geografia da Insônia”, de Jaime Vaz Brasil e Adriano Sperandir. Ótimo arranjo, mas execução também abaixo da média. Se tivesse passado, sem dúvida seria candidatíssima ao prêmio de melhor letra.
Conclusão: melhor um arranjo simples, mas bem executado, do que uma apresentação sofisticada, mas precária.
Esse foi o FUC 2010.
Depois de deixar o meu querido Rio Grande do Sul e ver os festivais gaúchos, que acompanho desde criança, entrarem em decadência, fico feliz em morar numa cidade que tem o FUC.
E essa cidade é Ponta Grossa.
Viva Ponta Grossa.
Viva a UEPG.
Longa vida ao FUC!!!
1º lugar - "Acabou-se Assim", do pernambucano Zé Manoel
2º lugar - "Água Boa de Beber", do carioca Zé Alexandre
3º lugar - "A Saber o Sabor", do mato-grossense Paulo Monarco
4º lugar - "Antiga Moda", de João Amalio Ribas, representando Ponta Grossa.
5º lugar - "Castelo", de Phayga Gruber, também de Ponta Grossa.
No FUC não tinha músicas para todos os gostos, mas sim, músicas para quem tem bom gosto. Que bom que ainda temos festivais com músicas de fato, e não apenas instrumentos e vozes fazendo "barulho" ao mesmo tempo.
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