Podemos definir o livro numa acepção mais ampla, como sendo todo e qualquer dispositivo através do qual uma civilização grava, fixa, memoriza para si e para a posteridade o conjunto de seus conhecimentos, de suas descobertas, de seus sistemas de crenças e os vôos de sua imaginação. Ou, num contexto mais moderno, segundo palavras do próprio Lucien Febvre (Martin, 1992:15): livro é o instrumento mais
poderoso de que pode dispor uma civilização para concentrar o pensamento disperso de seus representantes e conferir-lhe toda a eficácia, difundindo-o rapidamente no tecido social, com um mínimo de custos e de dificuldades. Sua função primordial é ''conferir [ao pensamento] um vigor centuplicado, uma coerência completamente nova e, por isso
mesmo, um poder incomparável de penetração e de irradiação".

(Arlindo Machado, no ensaio "Fim do livro?")

segunda-feira, 21 de junho de 2010

BOAS SURPRESAS NO FUC

POR FÁBIO AUGUSTO STEYER



Para quem estava acostumado com a qualidade dos festivais de música mais “arejados” do Rio Grande do Sul, o FUC, realizado pela UEPG, tem sido uma grata surpresa. É uma pena, mas os grandes festivais gaúchos, em especial aqueles que expandiram suas fronteiras rítmicas, musicais e geográficas, caso do Musicanto, da Moenda e do Canto da Lagoa, estão em franca decadência. As últimas edições não podem sequer ser comparadas em qualidade com aquelas dos anos 80 e início dos 90.
Mas desde que cheguei em Ponta Grossa, há dois anos atrás, o FUC tem me impressionado com a qualidade musical das concorrentes e com uma ótima organização – o que, sem dúvida alguma, faz (toda) a diferença.
Na última edição, encerrada sábado, dia 19, não foi diferente. A começar pelos ótimos jurados, super qualificados, inclusive na fase regional.
Das músicas que se classificaram para a final, nenhuma abaixo da crítica, e (quase) todas de excelente qualidade. A começar por aquelas oriundas da seleção regional. “Castelo” (5º lugar), de Phayga Gruber, mostrou que a simplicidade no arranjo e a singeleza na interpretação podem ser suficientes, desde que estejam em sintonia com uma boa letra e uma melodia cativante. A interpretação da autora, que evoluiu bastante da primeira até a última apresentação (foram três ao todo, duas nas eliminatórias e uma na finalíssima), também marcou a composição.
“Antiga Moda” (4º lugar), com belo trabalho vocal e refrão forte (“Uma moda de viola pra quem gosta de viola e não de moda”), de autoria de João Amalio Ribas, é um hino à música de raiz. Nas palavras do autor, “música não é produto, como fogão ou geladeira”. Um comentário bem instigante em noite de concorrência entre o FUC + João Bosco, no Ópera, e Victor e Léo, no Centro de Eventos...
O pernambucano Zé Manoel, que já havia se destacado no ano passado, recebeu o 1º lugar com “Acabou-se Assim”, uma canção interpretado por ele ao teclado e que lembra muito algumas composições de Chico Buarque.
O festivaleiro Zé Alexandre, ex-parceiro de Oswaldo Montenegro, ficou com o 2º lugar. "Água Boa de Beber" é canção típica de festival, com refrão forte e interpretação premiada pelos jurados. Aliás, os festivaleiros de costume, todos ótimos compositores e intérpretes, que rodam o Brasil inteiro nos eventos do gênero, não faltaram: Bilora, com a embolada “Peleja de Zé Coco do Riachão com o Capeta Famoso”; Carlos Gomes e Ivânia Catarina, com “Calanga Rei” (mais um refrão forte, vibrante – “Ô de dentro, ô de fora, louvemos a Nossa Senhora”); e Zebeto Corrêa (vencedor do FUC de 2008), com a singela “Corpo e Alma”.
Paulo Monarco, de Cuiabá, talvez tenha sido a melhor surpresa do festival. Sua “A Saber o Sabor”, 3ª colocada, era, sem dúvida alguma, uma das melhores músicas do festival. Excelente a letra, de Alisson Menezes, discutindo a noção de “verdade” no mundo contemporâneo:

“Você toma Coca-Cola sem saber o conteúdo,
E bebe as palavras como a ingerir morfina,
Faz da vida um imenso cálice
Sem notar que a verdade é apenas fé, menina!”

Os jurados acertaram dando à composição o prêmio de melhor Letra. Outro destaque foi o ótimo arranjo de Monarco, também o melhor desta edição, na minha opinião.
Entre as outras músicas classificadas para a final, destaque para “Pererê”, de Demetrius Lulo e Wagner Barbosa”, “Trem de Verão”, de Adilson Casado e Wilson Teixeira, “Cidade das Águas”, de Manoel Oliveira (que ficaria melhor com um arranjo mais arrojado); e “Mulato”, de Thirone. O ponto negativo do CD é “José Brasileiro”, que pretende fazer crítica social através de letra extremamente pobre e superficial, numa melodia também muito simples, imitando o estilo de Jorge Benjor.

Boas composições ficaram de fora da final
O CD do 23º FUC será de ótima qualidade musical. Pena que não haja grana para gravar em estúdio, o que valorizaria mais as músicas e a própria história/memória do festival. Infelizmente, gravações ao vivo muitas vezes pecam por problemas de sonorização, pelo improviso, pelos erros e mesmo pelos arranjos mal executados.
Aliás, esse foi o problema de várias boas músicas que não passaram à final. Caso de “Curitiba Vazia Sem Você”, uma bela milonga de Péricles Holleben Mello e Octávio Camargo Neto, que penou por ser muito mal executada na eliminatória do FUC regional. Nem tão grave foi o caso de “Geografia da Insônia”, de Jaime Vaz Brasil e Adriano Sperandir. Ótimo arranjo, mas execução também abaixo da média. Se tivesse passado, sem dúvida seria candidatíssima ao prêmio de melhor letra.
Conclusão: melhor um arranjo simples, mas bem executado, do que uma apresentação sofisticada, mas precária.
Esse foi o FUC 2010.
Depois de deixar o meu querido Rio Grande do Sul e ver os festivais gaúchos, que acompanho desde criança, entrarem em decadência, fico feliz em morar numa cidade que tem o FUC.
E essa cidade é Ponta Grossa.
Viva Ponta Grossa.
Viva a UEPG.
Longa vida ao FUC!!!


1º lugar - "Acabou-se Assim", do pernambucano Zé Manoel


2º lugar - "Água Boa de Beber", do carioca Zé Alexandre


3º lugar - "A Saber o Sabor", do mato-grossense Paulo Monarco


4º lugar - "Antiga Moda", de João Amalio Ribas, representando Ponta Grossa.


5º lugar - "Castelo", de Phayga Gruber, também de Ponta Grossa.

Um comentário:

  1. No FUC não tinha músicas para todos os gostos, mas sim, músicas para quem tem bom gosto. Que bom que ainda temos festivais com músicas de fato, e não apenas instrumentos e vozes fazendo "barulho" ao mesmo tempo.

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